26 de outubro de 2010

Por enquanto...

...fica essa apresentação feiosa mesmo, fornecida pelo blogger. Eu não entendo lhufas disso, então ela quebrará um galho até eu arrumar tudo de novo como dantes.
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E tempo pra escrever, ir aos lugares, ver bandas novas, enfim, movimentar a página... necas! ô vidinha mais ou menos!

25 de outubro de 2010

Blogger, me ajuda aí, vai...

Então, leitores:
Estamos tendo problemas na hora de carregar a página. Quem vem pouco aqui não se lembra do fundo bem traquina que meu bróder Maurílio fez para o blog.
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Talvez pelo fato de eu nunca tê-lo pago pelo trabalho, ele tenha amaldiçoado isso aqui, hehehehe.

11 de outubro de 2010

A arte de não fazer nada

Ah! A rotina de operário... quantos livros esperam por mim em minha estante? Quantos filmes há em meu HD, ou na prateleira, em formato físico (pois estão cada vez mais baratos), esperando pela minha retina? Sei que tenho dois exemplares da Revista de História com leitura começada, setembro e outubro, mas nenhuma finda. As contas estão pagas, meus financiamentos indicativos de presença na classe média idem. Tudo certo. O problema é minha alma, que anda com fome. Não ensaio com nenhuma de minhas bandas (Ímpeto, Tirei Zero, Sangue Seco, Palmatória) há quase um mês. Deixa eu chorar no seu ombro, amigo leitor? Ha, ha, ha, ha!
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Ontem fui ver o filme da Julia Roberts. Ela enfrenta uma crise ao chegar ao final dos 30 e perceber que havia construído uma vida de mentira. Muitos de nós se identificaria com a mensagem central. Ela sai em uma busca frenética por aquilo que a completaria. É um enredo já bem gasto, eu concordo, mas o filme é sensível, leve, e conta com o talento da Linda Mulher.
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Em uma parte do filme, na Itália, eu me vi na trama. Essa postagem de hoje não se estenderá demais: apenas uma indicação de como eu vejo a vida. É assim, de bate pronto, sem revisão nem nada, senão eu esqueço de por isto aqui.
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Genial a parte do filme, por mostrar uma visão simples, mas não simplista, de como viver. Os personagens que lançam a teoria são um barbeiro, um professor e um desocupado. "A arte de não fazer nada". Vale a pena.

6 de setembro de 2010

"A novidade é o máximo", já disseram...

Machadian Metal. Estava eu pensando: por que não? Estou imbuído de uma causa: conhecer o maior escritor brasileiro de todos os tempos com mais profundidade. O título de “maior” fica por conta de quem entende, então eu uso também. Comprei uma obra de contos, publicada originalmente em 1896, “Várias Histórias”. Fará conjunto com outras que tenho e não leio tanto, os romances. Consta na introdução do livro que foram contos publicados no jornal Gazeta de Notícias – conheço o periódico por ser assíduo leitor da Revista de História, da Biblioteca Nacional. Se todas as pessoas que admiro por serem inteligentes me dizem que Machado de Assis é legal, por que não tentar ver o que há de bom na obra do cara? Não sou muito chegado do realismo brasileiro, comecei mal a leitura do Machado, através do romance Quincas Borba. E então, diante do desafio auto-imposto, me peguei ruminando: que tal lançar o Machadian Metal? Puta enredo massa, dramático o suficiente, seria Bentinho’s doubt. Já imaginou? Tá, eu sei que não, é necessário ser muito frito para tanto. Mas tente: elementos de modinha portuguesa, bem a cara do Rio em fins do século XIX, olhe lá até mesmo um chorinho entre passagens de scream, breakdown e peso. Riffs em ré menor, corpse paint. The lady who give the cards já seria algo metalcore, enfatizando a desconfiança. Ou quem sabe Vilela’s revange? Não me decidi. Mas tenha certeza, ainda nesta semana colocarei um tópico na comunidade Goiânia Rock City, para montar minha banda de Machadian Metal.

Não se pode mais ser igual ao que está in. Há algum tempo, décadas diria eu, o lance é tentar ser a eterna novidade, preencher vácuos deixados nos espaços onde só cabem os cools. Então, a ordem é inventar. Até onde isso pode chegar? Não tenho a menor idéia. Talvez até teria alguma, se voltasse a ler mais sobre cultura de massa. Tô meio chateado com meu bróder Adorno. Soou meio elitista o que ele me disse em uns textos por aí, que só agora tive a oportunidade de ler. Ele dá a deixa: bom, só os clássicos da humanidade. Porra, então se eu montar uma banda de Machadian Metal, será “só o creme” da cultura, hein?

Inventar na cozinha ouvindo música é fácil, não tenho que submeter-me a julgamentos, se eu não quiser. Foi em uma sessão “Frankenstein” de cozinha que me ocorreu inventar novos gêneros de música.

Não como salmão todo dia. Logo, quando tenho um bom exemplar em mãos, costumo tomar cuidado no que faço. Tive coragem de inventar com uma boa peça semana passada. Marinei duas lindas e firmes postas, uns 300 gramas cada, coloridas artificialmente, em vinho verde, limão, um tanto de azeite, cebola, noz moscada, alho picado fresco, pimenta verde e dedo-de-moça e tempero caseiro com sal. (sim, se você quiser comer salmão cor de salmão original, viaje até o Alasca).

As pessoas do rock estão inventando muito ultimamente. Que tal o math rock? Pois me ocorreu criar o history rock, em defesa da minha causa. Letras somente com tese, antítese e síntese, citando as fontes imateriais e debatendo o objeto de análise. Assim, a gente mescla todas as escolas de history rock, sem preconceito. Vai ter banda de history rock abordando a pequena aldeia de artesãs cegas e manetas do Mezzo Mediterrâneo em fins do século X, e outras, compostas por barbudos ostentando Ernesto na camiseta, explicando como a burguesia revolucionou o mundo e oprimiu o operário. Lindo. E não só temáticas novas: que tal se as bandas só usassem cravos, violoncelos setecentistas, harpas minóicas e afins, tudo amplificado e com pedaleiras? Composições só se forem nas escalas pré-gregorianas, nada de dó, ré, mi, fá, sol, lá e si. Rensga.


Eu viajo mesmo quando estou cozinhando. É minha terapia, além da música. Selei o salmão numa frigideira com borda alta, em azeite bom. Rápido, nem cinco minutos. Já te disse, leitor, que gosto de suscitar a inveja nos vizinhos. Pois agora, ao levar o salmão pro fogo, subiu um perfume único do meu fogão. A carne é delicada, ao virar é necessário cuidado para não termos farofa de salmão, ao invés de lindas postas de um sedutor rosáceo. Recolha o bicho e peça para ele esperar um pouco de fora da festa.

Já imaginei por mais de uma vez o Brazilian Folk Metal, assim mesmo em inglês, para a contradição ficar patente. Dizem as línguas especializadas que o pirarucu é o salmão do Brasil, e já o vi figurar em algumas lendas do nosso folclore. Tascaria sem dó um disco Pirarucu’s Tales. Seria interessante narrar a epopéia da Stupid Little Horse without a head. E o que seria do disco sem Saci’s tricks ?!? No encarte, um prólogo sobre Monteiro Lobato. Coisa chique. Uma versão atualizada d’O Guarani, com duas baterias e cinco guitarristas, cada um com um solo de 7 minutos, lá no Teatro Municipal, em Sampa. Iracemas mil fazendo um balé moderno, post-punk-core.

Aquela frigideira com o azeite restante da passagem do salmão receberá tomates sem pele nem sementes bem maduros (dica: prefira os mais doces), cogumelos (usei os de conserva, fungi pleurotos, tipo shiitake, mas penso que cogumelos frescos dão mais sabor), e o resto da marinada. Acrescentei mais pimenta verde e um cadinho de noz. Refogar essa garotada até amolecer o tomate, o que não é demorado. E como era dia de fazer diferente, lasquei uma xícara servida de vinho verde no refogado. Ela caiu dando sopapos em todos os outros desavisados de dentro da panela. O lance é você dar tempo para o álcool evaporar, e não deixar secar. Tem que ficar suculento. Diminua a bravura da chama, deixe o molho apurar, e quando convier o ponto, artesanalmente coloque nosso rapazinho cor-de-rosa de volta, para ele experimentar do molho. Deixe eles ali, peixe e molho, se conhecendo, interagindo.

Trilha sonora pra esportes é algo já bem sacado. O que seria do skate sem som, não é verdade? Daí me ocorreu dar à luz o squash-punk. Trilha sonora irada pras manobras mais radicais deste esporte hiper hype. Como ninguém nunca pensou nisso? Grinders que nada, o lance é o squash-punk. Ou quem sabe o Bocha-metal. Sempre em italiano, podendo variar para o italiano novelo-Global, aquele com um vocábulo do Lácio por sentença, e o resto num português com sotaque de macarronada que dá uma vergonha alheia grande. Rolaria como pano de fundo nos emocionantes pegas ali no Bexiga, no Brás ou na Barra Funda, em São Paulo. Ou de repente, aqui em Nova Veneza.

Minha esposa ria, isso é bom. As mulheres gostam de rir com os homens, e não deles. Isso costuma abrir portas. Ela preparou algumas batatas cozidas em sal apenas, que ficaram bem firmes, refogadas em cebola, alho, pimenta do reino, tudo no azeite e um leve toque de orégano. Eu gostei demais.

Nosso salmão então tinha uma boa companhia. As batatas equilibraram o peixe, que ficou um pouco ácido, além da conta. Meus tomates não eram assim, uma Brastemp. A combinação dos ingredientes produziu algo legal, que para nós foi bom. Penso que para um chef profissional, o que fizemos se assemelha muito com Machadian Metal, Brazilian Folk Metal ou History rock.

Os vinhos verdes portugueses são excelentes para um dia de cardápio leve, como foi esse. São levemente gaseificados – o que comprei passou pelo processo artificialmente. Brancos e jovens, tem um perfume delicioso, frutado. O que tomamos vem de cortes de alvarinho e trajadura, sub-região de Monção e Melgaço. E o consegui por um excelente preço, algo menos do que 40 reais.

Inventar é sempre legal. Vamos ver até onde a criatividade leva o rock, nesta nova década que se inicia em 2011. Alguns caminhos já foram abertos, e tenho receio da maioria deles. Pra você ver, em pleno século XXI, numa noite de domingo em final de agosto, eu ainda dou ouvidos à obra de Ozzy Osbourne. Inventamos muito na cozinha, criamos uma receita com salmão, compramos um vinho português meio no escuro e acertamos, mas na música, ainda somos conservadores, caretas. Minha esposa e eu temos no velho Ozzy paixão comum. O novo disco Scream, só trás o mais do mesmo, e mesmo assim, é excelente.

Ah, sim! Qualquer interesse em montar projetos musicais com os novos estilos apresentados aqui, me contatem. Entre o Ímpeto, Sangue Seco e o Tirei Zero, deve haver uma brecha por aí.


16 de agosto de 2010

NET Goiânia, get off the air!


Se você tem boa memória e acompanha o blog (gargalhadas típicas do Chaves ao fundo na parte "acompanha o blog"), sabe que uso os serviços da empresa NET. Telefone, internet e TV.

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Cansei de ser esculachado. A impressão que eu tenho é de estar recebendo um enorme favor, ao invés de me sentir como um consumidor de um serviço caro à beça. Cansei de tirar e pôr a tomada do modem no interruptor em TODOS os problemas que relato às atendentes, como se isso resolvesse algo. Cansei de fazer download de arquivos em velocidades pré-históricas, pagando preços do futuro. Cansei de ver a velocidade da minha banda larga ser entregue pela METADE e ser cobrada de forma integral. Cansei. Como todo brasileiro médio, careta e pagador de seus impostos, demorei-me para cansar.

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Acredite em mim: dois anos de sofrimento. E se você hoje está crente, de bem com a humanidade, aqui vai mais um dado: NUNCA, eu disse NUNCA, atrasei um só dia nas mensalidades.

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Eu relatei "gatos" na minha instalação, que não foram resolvidos. Fiquei sem internet nas férias por 10 dias, quase fui parar num psiquiatra por isso. Tentando sanar o problema, três técnicos diferentes vieram e me deram três explicações completamente desconexas para o problema, acusando-se mutuamente de incompetência de quem os antecedeu. Risível.

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Minha fatura de telefone celular deverá vir com mais de dois dígitos neste mês. Nem mesmo meu ótimo plano de descontos e minutos vai conseguir me livrar da conta de 10 dias sem telefone fixo. Se vivêssemos num mundo justo, eu mandaria esta "bronca" para a NET pagar, e tudo seria resolvido (muitas risadas agora, e palmas, como em fim de série antiga americana).

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O mínimo que posso fazer é expor o caso. Então, minha dezena de audiência, se você pensa em adquirir ou migrar para uma empresa de telefonia e TV à cabo, não lhe recomendaria a NET. Amanhã, toda a parafernália deles estará fora da minha casa. Tomara.

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Enquanto estudo propostas de possíveis substitutos, o próximo texto do blog é uma icógnita, quanto à data que vai pra rede.

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De uma coisa eu sei: se eu ficar sem a série House, aí eu infarto.

13 de agosto de 2010

Entre copos e amizade

O inverno goianiense pede cerveja gelada. São complementares, aqui neste sertão, a estação e a bebida. Temperaturas sempre entre 25 e 30ºC. E um ar seco e carregado que faz sangrar meu nariz, em alguns dias.

No último sábado 7 o trabalho ocupou meu tempo apenas até as 11 da manhã. Depois disso, dia de folga. Precisava fazer algumas compras pra casa e me deparei, em um hipermercado, com a honesta Devassa Ruiva por convidativos 3 reais a garrafa. Fazer-se de rogado não é do meu feitio, adotei três mocinhas sardentinhas destas e as levei para o conforto de meu freezer doméstico. O clima desértico, a hora do almoço se avizinhando, tudo conspirava.

Mas parecia que meu capetinha interno não estava satisfeito. Rapidamente ele me convenceu da parvoíce do anjinho companheiro, e me convidou para mais. Era preciso dar valor ao último sabbath livre antes do início de minha rotina de escravo da indústria do vestibular. Era um brado de despedida. Afinal, sete dias adiante, eu estaria internado em uma sala de aula, repetindo coisas que já ministro no piloto automático. Pensando em bebedores disponíveis para dividir a mesa, e que tivessem a virtude de compartilhar minha amizade, os convites foram feitos aos meus parceiros de Sangue Seco, Guga Valente e Eduardo Mesquita, que tiveram o bom senso de aceitar. Afinal, não é todo dia que algum mortal tem a chance de aparecer por aqui, no blog. Modo “arrogância” para minha última sentença, por favor.

A bela largada do dia, bebendo cerveja de alta fermentação e personalidade forte, me inspirou a beber com qualidade, e não com quantidade. Sugeri visitarmos o bar Devassa, no templo de Mamon incrustado no Vaca Brava. Guga me alertou de um novo bar entre a T-7 e a T-9, na altura do Marcos. Rumamos para esta opção – Território da Picanha. Bar sertanejo, frustração: não sabíamos disso, embora pudéssemos deduzir, já que vivemos no “meio-oeste” do imaginário brasileiro. Mas era dia de alegria, e precisava muito mais do que um simples Victor e Léo pra estragar meu bom humor.

Conversar com amigos e beber cerveja. Às vezes me ocorre que muito da Criação (assim, com maiúscula) foi feita desta maneira. O Homem lá de cima (?) resenhando com São Pedro e pimba!, dá aquele insight no cara:
“–Tô vendo aqui, Pedrão! Pensa só, meu... Bóra descostelar o Adão, mandar uma moçoila pra ele e ver no que é que dá?”
São Pedro sorve um gole e dispara:
“–Aposto que dá merda, mermão... ops! Meu pai...”

É uma atividade digna de deuses mesmo. Largar de contar as voltas do ponteiro do relógio, esticar as pernas, coçar o saco à maneira dos ogros. E elencar assuntos dignos para o momento, é claro: futebol, mulheres e rock. É que somos caretas, sacomé né? Dá até pra esquecer da missão de “se unir aos proletários do mundo”.

Já tive muitos amigos de copo. Interessante mesmo é quando há a possibilidade de aprofundar a amizade nascente através de um caneco. Infantis, simples e sábias palavras de Shreck: somos como cebolas, temos camadas. E álcool é um excelente meio de descascá-las. A cerveja entra pela boca e abre a “caixa de ferramentas” do sujeito. As verdades pessoais saem pelos poros. Coisa bonita de se ver. No texto passado, eu falava sobre elementos charmosos do machismo. As juras de amor e consideração entre marmanjos bêbados à mesa do bar são, sem dúvida, partes do gênero. Tivemos isso neste sábado.

Iniciamos os trabalhos com uma instigante Baden Baden Red Ale. Cerveja nacional, de Campos do Jordão, tem como trunfo a excelente qualidade da água usada no fabrico da bebida. Como a produção é de pequena escala, há mais esmero na qualidade dos ingredientes, como lúpulos importados, por exemplo. Encorpada, forte, como esperado. A espuma é cremosa e saborosa, vale a pena deixar um dedo de colarinho. Minhas referências ao degustar uma cerveja mais elaborada não são as melhores possíveis. Estive e estou dentro de uma categoria de trabalhadores que não costumam ter muitas chance$ de apreciar algo muito além do que os hipermercados podem oferecer. Em suma, pra mim Baden Baden é um néctar. Pra quem já é conhecido até mesmo pelo nome pelo staff do Bolshoi, de repente, não. E não confunda isso que eu disse com rancor classista, por favor. É apenas uma fato, uma constatação.

A cerveja veio gelada no ponto ideal. Gostei muito disso: nada de sorvete, e tampouco de chá. Servida em baldes de gelo, o que me deixou ainda mais feliz. O bar transitava o serviço para o turno da noite, e na modorra do meio de tarde, um grupo de amigos bêbados esgoelava parte do repertório do DVD da dupla Jorge e Matheus, um tanto distantes de nossa mesa. Senti um leve desleixo no serviço e na organização do ambiente. Insisto que lavar copos de boteco deve ser um daqueles segredos de tribos no norte extremo das montanhas da Ásia Central, porque aqui em Goiânia ainda não vi um só lugar que me ofereça copos decentes pra começar a beber. Então, não vai ser por isso que vou maldizer a “galera do chapéu”. Outro sonho que tenho é ver as casas pequizeiras oferecerem copos mais adequados para tomar cerveja. Como produzir uma boa espuma e ainda preservar as propriedades do líquido em um copo sem curvatura própria para tal? Passo adiante esta pergunta.

No telão da área externa, um excelente programa de humor: jogo do Vila Nova, PFC. Tá certo, as coisas pra nós da Campininha não andam nada fáceis, mas há de se pesar as situações. Show de horrores, que não foi capaz de fazer meu corpo gastar nem a energia de virar a cadeira para assistir. Preferi os informes que chegavam pelos olhos angustiados de dois vilanovenses convictos, aliás, em pleno ato de contrição. Divertido.

A casa oferece uma excelente carta de cervejas. Só vi algo semelhante em raríssimos locais da capital. Entre nacionais e algumas importadas, há muitas opções para se beber bem. O cardápio não foge aos clássicos. Porções e pratos quentes de sempre, e me lembro de ter visto alguns risotos. Uma infinidade de clichês que agradam. O diferencial é mesmo a oferta de cerveja boa. Nem mesmo o ambiente, típico boteco goianiense, oferece um adendo. As instalações não são ruins, longe disso. Só não são “algo a mais”. Eu não gosto de dividir com outra pessoa o momento em que o efeito diurético da cerveja se manifesta. Logo, banheiros diminutos me deixam incomodado. Ficar espremido num momento tão narcisista como este é coisa degradante, e por isso sugiro ao bar que repense seu espaço de descarga de mercadoria consumida.

Tenho receio de ser injusto ao avaliar a cozinha de um lugar por apenas um prato ou dia. Há inúmeras variantes que podem atuar e causar desastres irreparáveis, afundando casas que se propuseram a atender um público minimamente exigente. Casos não faltam no folclore. Então, resolvemos ser razoáveis. Se estamos no Território da Picanha, por que não pedir um naco deste de boi? Feito. A Eisenbahn Pilsen é uma cerveja marcante, apesar de jovem no mercado. Prima por escolher muito bem os ingredientes. Aqui vai um comparativo para quem não é versado a pagar um pouquinho a mais por uma boa cerveja: perto da Devassa, a Eisenbahn parece cerveja importada. Excelente sabor: leve, mas imponente. É clara no copo, de espuma densa. E trocou figurinhas com o “X-Picanha” gigante que pedimos numa boa.

Eu explico o “X-Picanha”: mistureba atrapalhada de ingredientes, em uma chapa comum, dessas de pit-dogs. Mandioca em excesso, tomate com pele, semente e tudo mais, cebola, pimentão, e lá de vez em quando um teco de carne. Seria o caso de meu paladar ter corrido dali naquele justo momento, e eu ter me enganado quanto ao corte de carne que estava comendo? Improvável. Conheço o sabor de picanha, e sei quando como uma. Não foi o caso nesta feita. Tudo coberto por uma generosa camada de mussarela (a correção ortográfica do meu Word diz que é assim que se escreve). Daquelas comuns mesmo. Muito gostoso, mas de paladar grosseiro. Bom para acompanhar a cerveja, porém impróprio para o tamanho da responsabilidade. Uma boa cerveja exige um bom prato. Acreditei na possibilidade daquela “picanha” na chapa ser melhor executada. Comemos algo dispensável com uma boa cerveja. Reitero que estava bom, mas a Eisenbahn merecia mais. Senti que poderia ter pedido uma Antarctica mesmo.

Tudo é uma questão de referência, volto a dizer. A porção, de preço justo e tamanho certo, não deu conta da cerveja, mas isso foi minha impressão gustativa. Não vi meus companheiros abrindo sorrisos frente ao prato, por isso penso que não falo isso sozinho. Talvez mais capricho na execução da comida sirva para melhorá-la, um pouco menos de óleo, menos mandioca, e tomates limpos. Só aí, teríamos um enorme ganho.

Fomos informados que meu cartão de débito não seria aceito, por problemas técnicos na máquina, apenas na hora de acertar a conta e o serviço. Falha solene da casa. Não pagamos parte da conta naquele momento em nome dos direitos adquiridos no Código de Defesa do Consumidor. Bêbados sim, indiferentes à lei, nunca! E nem caloteiros: Guga pagou o restante no dia seguinte, depois que lhe repassei o dinheiro.

Beber com amigos deveria ser recomendado por médicos. Deveria ser prática de terapia. “Olha Astolfo, tô aqui te prescrevendo um porre semanal com o pessoal da repartição, certo? É certeza que assim, esse seu edema regride rápido”, diria o doutor. Com amigos de rock então, é cabeça boa garantida por toda a semana. Você que não é adepto, experimente. E se puder ser com cerveja boa, não abra mão. Vai por mim.

10 de agosto de 2010

Reminiscências

Itaquera, zona leste da capital paulista. Manhãs chuvosas de final de semana, de alguns dias perdidos no ano de 1985. Eu não me lembro do mês, e como chove metade do ano naquela cidade, essa referência climática acaba não ajudando.

Cena típica de convivência entre o proletário e sua dependência: sem nada para fazer, ambos iam ouvir música, a convite do pai. O disco, certa feita, foi um LP mix promocional, salvo engano da Som Livre, que existe até hoje na pequena coleção do velho metalúrgico. Trazia músicas de Tim Maia na fase mais FM, Belchior e Raul Seixas, quatro faixas de cada. O pequeno neto de imigrantes alemães, então contando com seus seis verões trancados em casa de bairro violento, gostava muito de uma música em especial: Trem das sete, interpretada por Raul. O então jovem operário fazia o gosto do herdeiro, indo direto para a faixa requerida, quando se atinham à audição daquela bolacha. Eu me lembro desta ser uma das atividades mais prazerosas que tive na minha infância: ouvir música no colo do meu pai.

Caía em velhos embustes para fazer rir meus tios que nos visitavam: certa vez, acreditei piamente que Tim Maia estava dentro das caixas de som de nosso antigo National, e por isso nós o ouvíamos. Plausível a explicação de como podíamos ouvir sua voz, para o moleque da casa. Depois de amplas gargalhadas na sala, entendi que o motivo de chiste ali era eu. Bons tempos, regados à Laranjinha do Bozo, com direito a canudinho especial, e ao sabor de Lolo, “o da vaquinha”.

E eu não imaginava que meu gosto musical estava sendo moldado ali. É certo que há tantas variantes na vida de um indivíduo, que fica impossível determinar que hoje ouço rock graças ao meu velho. Mas não poderia negar a influência, ao menos. Abandonei a mamadeira em meio a rodas de samba de raiz, outra paixão de meu pai. Estava sempre envolto em música, tendo um avô que além de ateu descendente de judeu fugitivo, era um exímio sanfoneiro. Conheço muitas músicas folclóricas teutônicas. Minha mãe é de origem mineira interiorana, então moda de viola nunca faltou naqueles três cômodos de bloco de concreto. E de tudo isso, escolhi o rock.

Meu pai tinha uma K-7 gravada de rádios, com inúmeros títulos que faziam as FM’s daqueles meados dos anos 80 ferverem. Ultraje a Rigor, Titãs, Plebe Rude, Paralamas do Sucesso, Heróis da Resistência e afins. Eu gostava muito de “Ciúme”. Havia uma marca de biscoitos que tinham o formato de bonequinhos, naquela época. Brincávamos, meu velho e eu, de teatrinho sobre a menina da letra da música do Ultraje.

A coisa ficou séria quando nos mudamos para Goiânia: um belo dia, aos 11 anos, meu pai achou que era hora de encerrar o doutrinamento. Sentou comigo no quarto que servia aos três irmãos, onde repousava o velho National 3 em 1 estéreo e ritualizou a herança de alguns discos: compactos originais de edições nacionais dos Beatles, de 67 e 69 (que fiz o favor de enfiar onde sua imaginação quiser), um LP de clássicos do Bill Halley and his Comets, alguns discos do Raul Seixas e coletâneas de rádios paulistas, como Antena 1 e Jovem Pan. Ali começou a minha própria coleção. Dali para frente, eu escolheria o que ouvir.

É certo que o que veio depois assustou um pouco o coração de meu pai: um violão, mais tarde uma guitarra, um contrabaixo. Meu primeiro emprego veio depois que ouvi um sonoro não para a compra de uma Jennifer de braço esmaltado. Se não viesse por meio do suor daquele caldeireiro industrial, viria então pela petulância do jovem empacotador de supermercado, que desafiando a orientação paterna, começou a trabalhar aos 15 anos para sustentar o vício em discos, fitas e camisetas de rock.

Brigamos, nos ofendemos, quebramos vários paus, sempre mantendo a certeza da razão, tanto eu como ele – eu sempre certo, ele idem. Sou familiar? Sim, famílias só mudam de endereço. A fórmula é sempre a mesma. Desde Sócrates na Atenas antiga.

Eu aprendi em casa que homem cozinha sim, e bem. Que pode dominar uma vassoura com destreza, e desvendar os mistérios de uma máquina de lavar. Aprendi que ser machista em algumas situações é até charmoso, porque faz parte daquele antigo cavalheirismo cortês que anda tão em baixa. Feministas, me desculpem: meu pai é um lord neste quesito. E eu acho isso muito bonito. O arroz dele é muito melhor que o meu ou o da minha mãe. E se um metalúrgico rude e mal-encarado pode cozinhar, por que eu não? Muitos preconceitos estúpidos deixei de ter por isso.

O meu talento para dilapidar o patrimônio pessoal, gastando em prazeres que poderiam esperar, principalmente aqueles que envolvem meu paladar e minha gula, é sem dúvida uma marca registrada de meu pai. Lição aprendida com louvor, nos vários sufocos por que passamos em família.

Hoje, adulto, vacinado e produto direto do modus operandi de criação de filhos do “seu” Carlos. Espero com muita ansiedade um show do Ultraje à Rigor, antigo desejo de quem me apresentou o rock. Ainda devo essa ao homem.

Não quero pesar nada depreciativo hoje, em minha relação com meu pai. Reservei este momento para pensar somente na importância de sua intervenção em minha vida. Nossas desavenças de outros tempos, onde minha ingenuidade saltava à vista, e talvez por isso moldava-me tão intempestivo, guardei-as para outra hora. Afinal, este crédito existe.

Notícia de última hora: se você aprecia a Bohemia Escura, corra para o Pró-Brazilian mais próximo de sua casa. Na loja da Vila Nova, a long Neck sai hoje por R$ 1,99. Em tempo, não aprendi a beber com meu pai. Perto de mim, ele bebe como uma moça, hehehe...

30 de julho de 2010

Sobre velharia: Desordem Progressiva.

Eu ainda possuo um toca fitas K7. Tenho uma pequena coleção de fitas demo, amealhada em fins dos anos 90, nada demais, uns 30 títulos. Época em que era fácil acompanhar o que saía do forno em Goiânia, pois gravar e soltar um material era coisa que poucas bandas faziam. Lançar LP ou CD então, era quase um épico.

Sinto-me em um momento de transição, e tenho certeza que grande parte dos roqueiros desta cidade compartilha disso, caso sejam membros da fatia trintona/quarentona de nossa classe. Eu gravei materiais com o Ímpeto há uma década que foram literalmente descartados pela imensa falta de qualidade no resultado obtido. Não me refiro ao óbvio, a falta de qualidade técnica/musical dos integrantes, que é parte da nossa proposta. Me refiro à péssima qualidade da aparelhagem de gravação. Gravar uma demonstração do trabalho exigia demais financeiramente. No máximo dois ou três locais em Goiânia faziam jus ao título de “estúdio”. Enfim, era então se contentar com as gravações de ensaio, que apenas davam uma idéia de como seria o trabalho das bandas. As gráficas, em sua esmagadora maioria, trabalhavam com máquinas antigas e caras, o que impossibilitava um bom resultado na arte das capas das fitas cassete. Programas de arte e design para computadores caseiros eram somente mitos vistos em filmes de ficção. Eu já comentei sobre isso por aqui.

E você me pergunta: tens saudades desta época, no sentido de ter sido mais suado o trabalho das bandas? Eu te digo: JAMAIS! Viva essa parafernália tecnológica, que permite fazer uma gravação relativamente decente dentro do próprio quarto! Esse avanço tecnológico é uma vitória.

Puxei uma das caixas de sapato em que guardo as fitinhas, respirei um pouco de poeira, metido numa nostalgia miserável de uma tarde de domingo. Escutei coisas que há mais de 10 anos eu não ouvia. Coisa boa e coisa que hoje eu ouço e penso: porque diabos eu comprei essa porcaria?

Já na noite daquele que seria mais um domingo caseiro, reencontrei a fita do Desordem Progressiva. “Você gosta disso”, me disseram os sentidos, embora eu já não me lembrasse dos sons. Pareceu coisa pensada: neste domingo de julho, tão cheio de nostalgia, tristezinha e suicídio a conta gotas, com cerveja barata em lata e fritura, muita fritura, reencontrar o Desordem Progressiva. Vento e sequidão, árvores desfolhadas... só me faltou óculos de aro grosso, um exemplar de um autor francês obscuro e pronto, eu seria um autêntico indie. Provocações infantis à parte, o trabalho deles é algo que merece ser relembrado. Minha esposa e eu precisávamos de uma janta de verdade, não agüentávamos mais batata frita. Resolvi mostrar a ela o som do Desordem e um peixe que eu ensaiava preparar há alguns dias.

Você conhece pirarara? É uma das carnes de peixe mais saborosas que já comi. Tive o prazer de conhecer e degustá-la bem fresca, no alto Araguaia, Araguatins (TO), ano passado. O peixe mede mais de metro e pesa como um homem adulto. Carne abundante. O que preparei aqui também estava fresco, e sempre que você for pensar em comer peixe, tenha isso como regra. As postas têm em média mais de 30 cm de diâmetro. Limpe a peça, reduza a quantidade de gordura, já que este é um peixe de abundante manteiga, mantenha o couro só se for de seu agrado, prepare cubos grandes, lave-os com limão e tempere com sal e o que mais seu paladar gostar. Carne de peixe absorve muito bem o tempero, então cuidado ao dosar. A vantagem da pirarara é ser uma carne firme. Trabalhá-la é fácil.

A minha fita do Desordem Progressiva é velha, tem 11 anos de idade. Então, qualidade de som, necas. Mesmo assim, enquanto me livro desse cheirinho de peixe e tempero entre meus dedos, escuto o trabalho. Enquadrei a danada na vitrola. E deixei os camaradas tocarem.

Mil referências ocorrem, que juntas acabam dando um quê autêntico, melancólico, assim como estava meu dia. Lembra brit rock, indie rock (como gostam de chamar hoje), pop, sei lá. Sou avesso a resumir trabalhos em uma simples escola de rock, embora o faça com certa freqüência. É sem querer, eu juro. Cantam em um bom português, o que eu considero um mérito, com letras de uma poesia adolescente, ingênua às vezes.

Foi curioso, esse trabalho me deu uma vontade grande de beber vinho, neste dia. Lembrei que esse tipo de som cria atmosferas interessantes, principalmente quando se está acompanhado. E o vinho é um excelente estimulante para estas ocasiões. Eu não ligo a mínima para convenções gastronômicas. Como e bebo aquilo que eu penso ser bom. Sou guiado completamente pelo meu paladar. Estou me lixando se para alguns, não “harmonizo” minhas refeições. Vinho tinto e peixe, aqui vamos nós. A vinícola portuguesa Messias tem rótulos para o dia-a-dia, e obedece aos padrões de qualidade europeus, como a “denominação de origem”, que te indica por exemplo o tipo de uva, solo e clima usados no fabrico do vinho. Eu tinha uma garrafa de Messias Bairrada, e ela nos serviu perfeitamente. Custou módicas dezenas de reais. Ultimamente, os vinhos portugueses são meus prediletos. Já havia lido sobre este vinho por aí, então eu sabia o que esperar. Cotidiano, mas gostoso. Nada para ficar fungando, rodopiando no copo, analisando no microscópio ou procurando uma leve nota de terra preta. Bom tanino.

A capa da demo tape, numa resolução digna de impressoras caseiras de 99, em cores, trás um cenário de outono, bem aos moldes de bandas deste universo: chão coberto de folhas secas, árvores esquálidas ao fundo. Não há um projeto gráfico, é bem “faça você mesmo”. Minha memória tem estado cada vez pior, mas tenho certeza de ter visto algo do Desordem Progressiva em CD-r. Eu não adquiri, somente a K-7.

As boas melodias são bem povoadas por duas guitarras cruas e sem muitos efeitos, que trabalham bem as oitavas, e um baixo que marca bem grave, sem virtuosismo algum, mas competente dentro da proposta estética da banda. A bateria é só um acompanhamento, reta, sem nenhuma “firula”, às vezes deveras simples, também atendendo ao que se exige dentro deste tipo de som. Os vocais, ora afinados, ora forçando a barra, não conseguem atingir os timbres necessários para a atmosfera criada. Seguram a onda e não comprometem. E não é que é massa demais o conjunto da obra? Soa garageiro, sincero. Cara, não sei se o leitor que conheceu o trabalho vai concordar comigo, mas a fita me lembra muito o Oasis antes de estourar, ali daquele EP “See the sun”. Soa como outras bandas inglesas do início dos 90. Isso é apenas uma impressão minha, e posso até estar ofendendo a banda sem saber. Sim, eu gosto de Oasis, e daí? Já conversamos sobre isso.

“Garoto Voador” inicia o trabalho levantando a questão da geração sem sonhos nascida a partir dos anos 80. E não se oferece uma verdade sobre esses garotos sem ideais. A letra lembra muito frases de fundo de caderno, que eram trocadas com a menina da qual estávamos afim no colégio. Depois de “9 de novembro”, uma alusão ao Muro de Berlim e todo o universo político que o tema envolve, temos “O Dia”: uma balada indie com jeito de banda inglesa lado B e letra sobre desilusão tanto no amor quanto nos outros humanos. Aqui, a voz de Fábio deixa a desejar. Mas eu acabo gostando dessa fronteira não muito nítida entre o técnico e o “mal-feito de propósito”. Não sei se era o caso, o objetivo da banda, mas assim eu vejo. E me agrada.

Fritar o peixe em bom azeite numa frigideira com bordas altas, até dourá-lo e firmar mais a carne, é tarefa fácil e cheirosa. Depois disso, separe as postas, e na mesma panela, frite umas tiras de bacon bem limpinhas (sem pele e magras), cebola, alho, junte tomate sem pele e miolo em cubos pequenos, uns pimentões coloridos (vermelho, amarelo e verde), e dê andamento.

Há um som nessa fitinha com uma pegada mais forte: “Lívido”. Temática já apresentada em outros sons – relacionamentos desencontrados – a música tem um riff que gruda na memória. Em nenhum momento do trabalho há solos elaborados demais, e muito, mas muito trabalho com escalas diferenciadas das duas guitarras. Não é inovador, mas é bem feito. Bem visível em “Por uma causa”, minha música favorita na fitinha.

Tomate e pimentão são sinônimos de água, caldo, líquido. Mas observe se às vezes não será necessário acrescentar mais um pouco disso. Se você está usando um fogão onde a chama é muito raivosa, é bom acompanhar de perto, pra não deixar o refogado secar, ou pior, queimar. Depois que o negócio estiver “firmeza”, com aquela cara bonita e sorridente, traga o peixe pra se divertir ali. Socialize a rapaziada, coloque-os para bater um papo. Diga a eles que o som que vem da sala é de qualidade. Traga os camaradas do cheiro verde bem picados e meio caldo de camarão amassado, para diluir mais rápido. Quem sabe algumas alcaparras? Ou azeitonas pretas, obviamente descaroçadas? Por observação de campo, te digo que ambos, bolinhas verdes e pretas na mesma panela, desandam. Prove o sal dessa galera toda, e faça os ajustes. Seus vizinhos estarão numa puta inveja do perfume que emana da sua casa agora. Isso não é legal? É diversão garantida.

A fita do Desordem Progressiva acaba com o som “Perdidos no Tempo”, que eu não pude sacar. Meu toca-fitas deu pau. Pra falar a verdade, ao virá-la no meu velho Philips, ouvi a rotação diminuindo. Mas por não manusear um toca-fitas há um bom tempo, acabei me esquecendo que isso era sinal de fita embolada. Nada que uma Bic e paciência não resolva, depois de comer, é lógico.

Eu juntei um arroz branquinho previamente cozido nessa panela aí, pra brincar um pouco de paella. Se você tiver o arroz próprio para o preparo desta iguaria, eu recomendo, viu? Com o nosso arroz tipo 1 de qualidade, não é a mesma coisa não. Fica muito gostoso, é verdade. Mas não saia por aí dizendo que já comeu paella. Inclusive, nem é essa a intenção das dicas aí de cima, beleza? Em tempo: o vinho tinto Messias Bairrada é uma porrada, mas o prato segura a onda pelo excesso “do bem” de tempero. Andaram de mãos dadas numa boa.

Tive uma “rápida amizade” com o Júnior, baixista da banda. Ensaiei no estúdio do Desordem por quase um ano, ali na rua 68, no Centrão. Pessoa tranqüila, que gostava de quebrar um galho, tinha a parcimônia de ouvir o Kundaline e ainda incentivar, ali pelos idos de 99 e 2000. Enquanto sorvo o vinho, o filme passa nítido na minha cabeça: foram legais aqueles tempos. Não se falava em profissionalismo com tanta freqüência, assim como hoje. A grande maioria destas bandas ditas indies tocava talvez pra satisfazer o ego, imitando seus ídolos do rock. Pelo que me consta, as críticas da época em relação ao Desordem Progressiva se baseavam no fato de eles se encontrarem no limiar de um som quase profissional e um som sem pretensões, mas bem feito. Eram acusados de não serem profissionais o bastante e deveras trampado para ser informal. Isso posto de lado, recomendo que você procure ouvir. Foi uma das boas bandas daquela safra do fim dos 90. Made in Cantoria, nos “Domingões da Brodagem”. Tocaram em alguns festivais maiores, e mais uma vez vou confiar nessa memória torta minha: estiveram em uma edição do Noise e/ou Bananada. Depois que a banda se desfez, perdi o contato completamente com os caras. E como eu não era parte desta galera do rock indie pequizeiro, não sei te falar o que houve ao certo. Eu vi algumas apresentações da banda, e gostei muito. Não os vejo pelos rocks da vida. Gostaria muito de os encontrar e pedir permissão para digitalizar a fita demo deles. Compartilhar o som do Desordem Progressiva com quem não conhece e gosta do estilo, é uma obrigação. Fique no aguardo, quem sabe um dia esta fita não aparece por aqui...

E vinho bom é outra história. O prazer proporcionado à alma é tão grande, que a ressaca não tem coragem de aparecer no outro dia.

12 de julho de 2010

A Velha Guarda na ativa: Underground Forces e Mortuário no fim de semana.

A Copa do Mundo não me empolgou mais depois das derrotas do Brasil para a Holanda nas quartas, e da Alemanha para a Espanha, na semifinal. Esta última eu considero a maior injustiça do campeonato. Na minha opinião de torcedor, ganhou o caneco uma seleção de futebol medíocre, que em momento algum despertou brilho neste olhar aqui. Sim, está certo que o futebol alemão nunca foi técnico e bonito, mas é de longe a melhor aplicação tática do mundo, e isso é gostoso de ver. Acrescento que, nesta Copa, eles ainda contaram com talentos individuais que trouxeram leveza ao jogo deles. Algo que faltou aos montes do lado verde-amarelo. Dunga e seus selecionados foram longe até demais frente ao futebol pobre, medroso e burocrático que jogaram. E essa é a graça do futebol: nem sempre ganha quem a gente quer. Quando me lembrei do jogo final, passavam 30 minutos do primeiro tempo. E tamanha foi a modorra que ele me proporcionou, que preferi rever pela milésima vez um episódio de Law & Order, temporada 2009. Muito mais interessante.

Na primeira parte do domingo de ressaca, procedemos a recuperação física pós-Underground Forces, no Old Stúdio. Puta evento massa na nova casa do Marcelão. O underground goianiense passou todo ali, e se há alguém que pode narrar parte considerável desta história, é aquele polaco gente fina. Torço aqui para que vingue esse novo espaço. Natal e Segundo estiveram na retaguarda do evento, que contou com All Torment, Old Place, Golpe de Foice e Tirei Zero no “palco”. Não tinha cara de “show”, na acepção da palavra (envolvendo uma produção, voltada ao público, interessada em retorno, enfim...). O lance foi algo semelhante à uma festa de amigos e chegados. Ou as “duas coisas”, como diria Chiquinha Maria Antonieta de las Nieves.

Comprei dois novos discos na banca da Two Beers, que marcava presença lá no Old Stúdio. Lançamentos goianos, ambos: O EP independente da banda de Formosa, Golpe de Foice, intitulado “Câncer da Terra”, que havia sido recomendada dantes. E a patada da capital – Mortuário, “Vidro na Cara”, lançado pelo selo dono da banquinha. Ao assistir a apresentação dos moços de Formosa, as referências imediatas são do mais puro grind core. Você se lembra de Disrupt, Extreme Noise Terror, Napalm Death das antigas. E se você é apreciador de boas canções do gênero, assim como este aqui que segura a pena do lado oposto do monitor, entendeu que é coisa fina de se ver/ouvir. O fôlego do baterista é irritante para alguém que, assim como eu, mal consegue subir as escadas do prédio onde mora. Sobre o disquinho, gravação caseira de boa qualidade, projeto gráfico pouco audacioso que muito lembra as demo tapes dos anos 80 e 90, tudo em preto e branco. Temas recorrentes ao universo punk hardcore em letras que primam pela simplicidade. Mensagens diretas: condenação de emos (parênteses para deixar aqui meu estranhamento com a letra, por ser pobre, preconceituosa e incitar a violência gratuita), anticlericalismo, degeneração da raça humana, crítica à politicagem, anarquismo e “canibalismo social”. Seis sons próprios e um “cover” de Extreme Noise Terror. Riffs e bases rápidas bem sacadas. Eu sei que vou ouvir mais vezes, apesar dos pesares. Meus anos de radicalismo ficaram pra trás, mesmo eu não sabendo se isso é de todo bom ou ruim.

Eu assisti aos shows de metal. Aliás, a idéia era essa por parte dos organizadores: tentar promover a famigerada “união” da galera hardcore punk com metaleiros (nossa, me senti nos anos 80 usando esses rótulos! he, he, he...). Se vai dar certo, eu não sei. É esforço antigo. Veremos. Gostei do All Torment, achei bacana. O Old Place teve sua audição prejudicada pelos beborríveis presentes, que não me deixaram sacar direito a banda. Pena, pois eu estava muito interessado em conhecer. Farofeiros de Goiânia, uni-vos!

Deixamos o evento após o show do Tirei Zero, banda da qual faço parte, tocando guitarra. Cansados, minha esposa e eu. Dali, apeamos no “nosso” bar, tomamos uma breja e um caldo. Caldo de fim de noite é sagrado para garantir o dia seguinte. Taí uma dica para os iniciantes na carreira etílica.

Recuperados do rolê no dia seguinte, ficamos em casa mesmo. Uma boa carne frita, coxão mole limpo de gordura, fatiado em tiras. “Nosso” açougueiro não cobra a limpeza, pesando a carne sem a gordura. Já vi alguns que só eliminam totalmente a manteiga após pesarem a peça. Fique esperto, pois isso é ilegal. Bem acebolada, com muito alho, uma pequena e charmosa dose de pimenta do reino. E nós gostamos de shoyu, apenas para aplacar parte do possível azedume da cebola. Pouco também, algumas gotas. Escolher bem a “matéria-prima” é o único truque para comer bem. Carne fresca, limpa e bem temperada, cortada respeitando a disposição das fibras, frita em bom azeite. Sucesso.

A Bohemia de hoje não é a mesma de 15 anos atrás. Você, eu e as pedras de Pirenópolis sabemos disso. Não sei exatamente quando isso ocorreu. Mas está cada vez menos interessante pagar mais por um produto que já não tem o diferencial frente aos demais similares no mercado. O lúpulo que dava o sabor característico à marca está menos proeminente. E venho observando esta queda qualitativa não só na pilsen que tomei neste domingo. Desonesto, desestimulante. Até mesmo o aroma foi prejudicado. Há uma década, identificava-se Bohemia pelo olfato. Acredite, jovem bebedor.

Mesmo assim, no copo próprio, que se encontra em muitos lugares por aí, a espuma continua cremosa. Das pilsens nacionais de larga escala, é de longe a melhor e mais saborosa. E ainda combina com a nossa carne frita. E serviu para regar a audiência do disco do Mortuário. Bolachinha na bandeja do toca CD, Dri na cama para uma soneca pós-almoço. Pra ela, é pedir demais. Tímpanos sensíveis.

Ao abrir a caixinha, tem-se um projeto gráfico legal, que pretende acompanhar a proposta do trabalho da banda. Discreto e obscuro o encarte. Evoca-se sangue, barulho, confusão mental, referências políticas. Porco e Bush: par bem casado. Linkado com o som de abertura do disco, “Bagdah”. Excelente introdução temática, com uma produção dando ênfase ao peso do som: guitarras cruas saltam aos ouvidos. Riffs rápidos e solos bem montados. “Boca Suja” vem com um riff muito foda de introdução também, continuando o tom da primeira música, numa levada death metal. O vocal do Aurélio é assustador durante todo o disco. Daqui do alto da prepotência do meu gosto musical, eu não gostei das intervenções de vocal do Foca, assim como eu não gosto ao vivo. “Vidro na cara” trás uma introdução massa assim como as duas primeiras, old school mesmo. Há um riff no meio da música que lembra Sepultura do Arise ou Beneath the Remains. E meu medo é que isso não soe como elogio, vai saber, né? A porradaria agressiva, suja, descrente de inúmeros valores sociais, continua em “O Seu Pior”. Tenho receio em sair carimbando trabalhos alheios com rótulos indesejáveis, mas o lance é mesmo um death metal com pitadas de hardcore metal. Pesado e consistente. O tímpano fica completamente preenchido o tempo todo.


A partir de “Camburão Negão”, passando por “Barriga” e indo até “Porcaria”, percebemos uma queda de fôlego, de inovação. Os sons ficam menos elaborados, mais crus. Tem-se a impressão de que os três sons são na verdade um só. Talvez (e põe talvez nisso, pois aqui neste blog o lance gira em torno do achismo mesmo...) falte tons diferentes de música para música. Os riffs são bem trabalhados, rápidos, mas em certo ponto enjoam.

A retomada veio em “Mendigo”. Solos que lembram muito, mas muito mesmo bandas thrash metal oitentistas. “Pinga no Garrafão” (com uma homenagem ao lendário Marcão) e “Verme” encerram o festival de sarcasmos, ironias e descrença com convenções sociais que são destilados neste disco. Bem pensadas para o final, trazem elementos que espantam de vez a pequena monotonia do meio do trabalho. O “gran finale”, com um arranjo bonito de percussão, ficou diferente, minimalista diria eu, he, he, he...

E é lógico que meu leitor sabe que impressões pessoais são deveras diferentes de resenha ou crítica profissional. Compre, ouça e depois me diga você o que percebeu.
Errei na mão ao calcular a quantidade de carne que iríamos comer. Sobrou demais. Comida esquentada é uma lástima. Minha sorte é que já tenho começado o almoço de segunda-feira. Nada convidativo, eu sei. Mas é a realidade.




8 de julho de 2010

"Eles" não estavam lá...


Passei o 6 de julho ansioso. Finalizando médias de recuperação dos meus gênios, o último trabalho extra-sala deste professor antes das férias. E aguardando a apresentação de Renato Teixeira, no projeto de música do Flamboyant. A considerar, o desconforto que me causava o local onde o show iria acontecer. Não é nenhum tipo de recalque, ódio classista ou algo que o valha. Eu simplesmente não gosto de shopping center, só isso. Vale para todos. Havia anos, ao pé da letra, que eu não ia ao Flamboyant. Da última vez que estive lá, foi para ver o filme “Auto da Compadecida”, com minha ainda namorada, atual esposa.

Eu tenho uma estranha impressão de estar sobrando nestes lugares. Principalmente nos shoppings mais sofisticados. Não gosto de ser observado. E como não atualizo meu guarda-roupa com freqüência, digamos que destôo um pouco da paisagem, para não ser cruel comigo mesmo. Não gosto de multidão. É, eu sei, soa contraditório, mas é isso. E aquele cheiro bizonho específico dali, nem me fale. Ao final do dilema, vale a pena enfrentar o templo maior do Jardim Goiás se o prêmio for uma apresentação de Renato Teixeira.

Conheci o trabalho deste violeiro em casa, junto à família roceira que tenho. As raízes dos Lopes estão profundamente fincadas no Triângulo Mineiro e interior paulista. Desde sempre eu ouço as canções deste que considero um dos maiores compositores de música caipira do final do século XX.

Como não precisava comprar nada que superasse a quantia de R$ 150, não ganhei entradas para assistir à apresentação sentado. Assim era a promoção das lojas. Acompanhamos tudo em pé, do fundo do espaço em um dos estacionamentos. Mas antes de nos acomodarmos, um pequeno pavor ainda me agitava o âmago: e se ELES estiverem lá?

“Eles”? Eles e elas são ruidosos. Andam aos bandos, e as estirpes masculinas não se importam de colocar sua descendência em risco com calças jeans Smith Brothers estupidamente apertadas. Não há problema se já é noite para o uso de chapéu, afinal ele não serve para tampar os raios solares, e sim para ostentar etiquetas procedentes da Casa do Rodeio. As botas destes tipos humanos não têm nenhum resquício de poeira vermelha de terra, só mesmo aquela preta, de asfalto. Geralmente se deslocam em enormes caminhonetes ou utilitários, que nunca carregam produtos do campo, mas na maioria das vezes, equipamentos de som muito mais caros que meu carro. O dialeto “deles” inclui expressões idiomáticas como “tchê, tchê, tchê!!!” (gritado pelo grupo como demonstração de júbilo), e dezenas de outras mais, cristalizadas por uma cultura própria. “Eles e elas”: caubóis e cowgirls do asfalto. Arremedo do homem do campo brasileiro, que se apossaram da cultura caipira ilegitimamente. Se eles estivessem lá em grande número, eu desanimaria e provavelmente, volveria à casa. Eu realmente não sabia se a obra de Renato Teixeira já havia sido pasteurizada e enlatada em grandes escalas. Ora, Tonico e Tinoco, Pedro Bento e Zé da Estrada, Zé Fortuna e Pitangueira, e outros gênios mais, hoje não fazem a alegria dos “sertanejos universitários”? Eu temia que as canções que aprendi a admirar pela leveza, beleza, sinceridade, já tivessem sido transformadas em hinos da galera da fivela de prato.

Sim, fui preconceituoso. E daí? Não sou obrigado a ser isento aqui. Mas me enganei. Felizmente. Como fiquei aliviado ao perceber que “eles” não estavam lá. Nem ao menos um da espécie. Não ouvi nenhum versinho rimando morena com pequena, e ao fim um original “seguuuuuura peão!”. Ufa! Pude ouvir os dedos do músico “trastejando” no braço do violão. Pude ouvir a poesia caipira palavra por palavra. Cada canção, uma pequena homenagem à natureza, à simplicidade, à vida. Acompanhado por seus filhos (baixo e segundo violão/voz) e um baterista, desfilaram canções conhecidas de qualquer um que goste do gênero. Todos os clássicos do compositor, e de outros compositores igualmente importantes. Renato Teixeira continua preciso naquilo que quer transmitir, pois utiliza-se de sinceridade para falar através de sua música. Escreve sobre aquilo que vive/viveu, e por isso soa original e verdadeiro o tempo todo. Seu estilo introspectivo de se apresentar nos leva à intimidade com o cantor. Nada de agudos intermináveis “xonados” ou “marvados”. Apenas uma voz doce e na medida pra traduzir a alma do campo.

E ali mesmo, na sua apresentação curta de 1 hora cravada, eu entendi. Nenhum verso de duplo sentido. Nenhuma rima a ser substituída por equivalente chulo. Nenhum “segura”, ou “simbóra”, ou “aôôô”. Nenhuma “bandida”. Nenhuma canção de estrutura fácil, e sim vários acordes rebuscados. Arranjos de bateria e percussão originais, emulando sons do campo. É por isso que nenhum espécime “sertanejo universitário” estava lá. Confirmei uma antiga teoria minha: há música caipira de qualidade superior. Há vida inteligente fora das FM’s. Há sensibilidade ainda no universo dito “sertanejo”.

Talvez neste texto de hoje eu fale mais sozinho do que de costume. Já não tenho muitos leitores, ao abordar música caipira então... mas me senti na obrigação de escrever sobre uma noite em que o casal Alemão transcendeu. A apresentação de Renato Teixeira nos deixou muito felizes. E tratar da vulgarização da arte, mesmo em um patamar diferente daquele que vínhamos aqui abordando, sempre é bom. Alfinetar um universo alheio ao meu, sem a menor responsabilidade, é melhor ainda. Ah! O politicamente incorreto...

Ao final do show, precisávamos comer algo. Já passava das 8 da noite, estávamos famintos. A praça de alimentação de um shopping do porte do Flamboyant dispensa comentários óbvios. Preços estratosféricos, idem. Chamar um sanduíche, ou fritas e demais similares de fast-food ou junkie-food, é natural. Mas chamar churrasco disso? Não nos agüentamos, ficamos muito curiosos. Arrombo no bolso, aqui vamos nós. Dois bifes de picanha grelhados acompanhados de fritas sabor fast-food e legumes, grelhados. Saladinha de brinde. Carne é bom, no espeto da churrascaria é melhor, e em casa é o ideal. Grelhar berinjela e abobrinha? Parabéns pela originalidade, que se mostrou desastrosa. Pelo preço que pagamos no nosso “jantar”, comeríamos em uma churrascaria concorrente carne de verdade. Lição aprendida. Churrasco não pode ser “Express”, senão seu dinheiro vai embora sem lhe proporcionar o prazer esperado. Chopp Brahma é sempre gostoso, se tomarmos como referencial o mundo mortal. Lá, o preço não me assustou, apesar de considerá-lo alto. Maior que no quiosque da marca. Não estou aqui pra dizer que a comida estava ruim. Não sou hipócrita. Mas tenho o dever de bom cidadão em lhe alertar que por preços similares você come melhor, com mais conforto e com bem menos emos por metro quadrado. E não há nada lá que supere qualquer outra casa de fast-food. Não há motivos para que regressemos.

Mesmo após o jantar, a música de Renato Teixeira ecoava fundo na alma. Aqueles versos desconcertantes, de tão simples e belos, encaixados em melodias inteligentes que fogem aos clichês, são uma fórmula que explica o pouco apelo comercial do compositor. E não é o caso de ouvir sua música só porque é “cool” gostar de algo assim, under. Eu gosto de um caminhão de coisas do mainstream. Apreciar a obra deste paulista do interior é como voltar no tempo e ouvir aquelas cantigas que a vovó cantava na beira do tanque. É como ouvir as músicas que o vovô assoviava baixinho esperando o piau beliscar. É reconfortante. Uma impressão que poucos ainda têm. E eu sou imensamente grato de ser um destes.

26 de junho de 2010

Divulgue seu trampo aqui no blog!

Bandas de todas as vertentes roqueiras, uni-vos! Pelo menos aqui. Deixe seu endereço eletrônico nos comentários deste texto e, tchã nã!, ele aparecerá na lista de sugestões musicais. A sessão ali do lado, chamada "Aos seus tímpanos".
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Não é concurso, é simples assim. Quer o seu sítio na internet bombando? Então, manda ele aqui!

25 de junho de 2010

Conformistas. Será que ao menos sabemos disso?


Aprendi muita coisa de língua inglesa traduzindo letras de músicas das bandas que eu ouvia no ensino médio. Eu era inclusive elogiado pela professora Ereni, pelo meu bom desempenho em sua matéria. Nerdismo à flor da pele. Bons tempos.
Foi nesta época que eu conheci o Dead Kennedys e o seu disco “Bedtime for Democracy”. As melhores letras do hardcore punk de todos os tempos estão ali, segundo a modestíssima opinião deste apaixonado e completamente parcial observador. Foi ali que eu percebi o quão inteligente pode ser a produção de arte punk. Nada de discursos clichês e vazios de significado. Nada de frases feitas, de impacto, nada cifrado ou criptografado. O disco é um murro no olho. Ainda sem internet disponível para mortais filhos de operários, estudantes de colégios periféricos estaduais e afins (lembre-se que eu disse estar no ensino médio, ou seja, era do quartenário cenozóico superior, ou coisa do tipo), pesquisei demais pra entender grande parte do conteúdo. A capa por si só já faz este convite. E veja só: um caminhão de coisas passaram desapercebidas neste primeiro contato, pois a informação, no início dos anos 90, ainda era difícil de se conseguir. Digamos que o caldo do trabalho eu saquei.
Eu pirei naquilo tudo. E me alimentei muito nessa fonte. A escolha em usar a música para o discurso político foi feita ali: de 1995 em diante, toneladas de bandas, fanzines e demais materiais iam me preenchendo. “Santa” passagem pela Escola Técnica Federal de Goiás.
E aí, no velho orkut, semana passada, rolou um daqueles raríssimos papos inteligentes na comunidade “Goiânia Rock City”. Wander Segundo, administrador do selo Two Beers or not Two Beers, figura empenhada em aprofundar o debate sempre, jogou titica de galinha de conformista no ventilador da cena hardcore punk em dois tópicos. Um em especial, citando a letra mais completa do punk na história, em alusão à cena rock goianiense: http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=61338&tid=5485373415445971936.
Entenda o título desta provocação visitando o endereço. Debate sugerido, estou aqui quase enamorado de meus fictícios botões: o discurso punk realmente ainda é viável? Digo: me foi, durante anos em que eu adolescia.
Quando entrei para a faculdade de História, as coisas começaram a mudar. O nerdismo aumentou, eu tive contato com um novo mundo, e grande parte do discurso hardcore punk o qual eu tinha acesso começou a soar infantil, datado, ultrapassado, ingênuo. A medida em que os grandes autores da filosofia, historiografia, sociologia e outras logias entravam em minha cabeça, os compositores e escritores do hardcore e punk iam deixando de me seduzir. Me lembro muito bem: meu professor de Teoria da História, Walmir Barbosa, me emprestou uma coletânea de Adorno. Minha vida mudou ali, pelo prazer de ler algo tão instigante. Mudou mais ainda depois que eu entendi os textos, he he he. Com Georg Lukács foi semelhante.
É compreensível que a crítica social presente no discurso hardcore punk fosse rasa e ingênua no início. Afinal, não estamos falando de algo direcionado para bancos acadêmicos. Mas há de se considerar todo o avanço das condições históricas, desde o surgimento do punk, nos idos de 74/75 até hoje: os desafios estão maiores, pois os problemas levantados pelo punk nos anos 70 se agudizaram. A indústria cultural avançou e pasteurizou o próprio punk e seus sub-gêneros. As guerras não acabaram, a desigualdade social é maior hoje que 40 anos atrás, e se fôssemos listar toda a gama de possibilidades a serem criticadas pelo punk, escreveríamos um tratado. E a pergunta premiada é: o punk, como ferramenta social de contestação, de contra-hegemonia cultural, também avançou? Passo. A apropriação do discurso, da estética, enfim, do “espírito” punk pela cultura de massa foi respondida com novas formulações destes?
Um dos problemas está justamente aí: considerar que exista um padrão de comportamento a ser seguido para quem se dispuser a fazer música punk. Um dos efeitos nefastos do modelo de mercadorização da arte é descaracterizá-la e embalá-la com outra roupagem. Nem todo mundo que faz música punk hoje quer usar do clássico discurso de protesto, direcionado para o quer que seja. O diferencial do punk, dentro do espectro artístico, sempre foi o discurso. A música apenas embala aquilo que o punk faz(ia) de melhor: contestação.
Isso chega a ser uma contradição? Não. Somente se considerarmos que exista o punk “certo” e o punk “errado”. Certo: manter o discurso ácido de crítica social. Errado: montar uma banda pra aparecer na MTV. Ironia barata à parte, sabemos que não existem donos da música, que é uma expressão universal da humanidade. Este passo é importante para que não se cobre algo implausível: apontar o dedo para pessoas que, mesmo sabendo disso que estamos aqui discutindo, não comungue desta visão em particular, vire-se para o dedo acusador e solte um folgado e despreocupado “foda-se”.
O conformismo, criticado dantes por punks, é marca dentro do prórpio. E não seria aí um momento de delimitar rupturas? Marcar posições e esclarecer? Dizer que o “Punk não é somente uma estética artística, mas se construiu historicamente como alternativa à cultura de massa, através de um discurso próprio que oferecia uma leitura concreta da realidade” seria um bom começo para este processo, não?
O punk saiu da periferia operária das metrópoles, aqui no Brasil. E isso já faz um bom tempo. Em Goiânia, ele nunca esteve lá, pelo menos não como discurso principal. Outras manifestações culturais e estéticas musicais são os atuais veículos das idéias de contestação. O rap, por exemplo. E isso causa um imenso problema: a questão de um discurso ilegítimo, se perpetrado por indivíduos alheios à realidade em questão.
Você vai citar excessões de coletivos punks, eu sei. De pessoas que se proletarizam por livre e espontânea vontade, por vezes. Eu nunca acreditei no discurso “Ei, estou aqui afundado na lama pra sentir o desgosto do mundo. É assim que ele vai mudar”. Muito menos no “minha demo está na Eslovênia e de lá, chegou na Estônia. E assim, eu mudei o mundo”. A mudança comportamental e o discurso de transformação pelo caos sempre me soaram preguiçosos. Então, devemos deixar o mundo se acabar primeiro, pra depois construir outro? Volto a tocar a mesma nota de antes: ingenuidade, infantilidade. O neoliberalismo agradece, e muito, esta inércia e ceticismo com ações políticas. Há 35 anos, diziam por aí que não haveria futuro pra nós. Drogaram-se e esperaram o caos chegar, pois a sociedade era um lixo e blá, blá, blá. E o que sobreveio foi sim o caos. Estaria ainda muito cedo para se iniciar uma reação?
Shows por si só não contribuem. Demos e discos por si só, muito menos. Camisetas, patches, braceletes, são só acessórios. Tênis de cano alto é apenas mais uma moda imbecil, saudosista por uma época que nem todos viveram. Se não há a circulação de idéias, o debate, a construção de alternativas para a difusão independente da arte contra-hegemônica, e se nessa arte o discurso não for mais importante que a música, não há cena. Hoje, o governo sustenta o rock. A iniciativa privada sustenta o rock. Guitarras e visual, por si só, não mudam porra nenhuma. Pelo menos se você pensa em contribuir como indivíduo ativo para a trasformação de modelo social.
Conformistas? Sim. Mas talvez sem nem ao menos saber disso. É assim que percebo a cena hardcore punk goianiense hoje. Faltam mais Biafras entre nós. Em quantas palestras sobre algo relacionado à esta discussão você foi neste último ano? Quantos livros você leu sobre estes apontamentos aqui colocados? Quantos filmes fizemos sobre a cena hardcore punk na última década? Qual foi a última vez em que paramos e pensamos se o hardcore punk realmente contribui conosco para uma formação mais humanista?
Som por som. Visual. Reconhecimento efêmero junto aos amigos. Demonstração de virilidade. Fuga covarde da realidade enebriando-se quimicamente. Novas bandas, problemas velhos.

19 de junho de 2010

E os ingressos para o Punx Not Profits vão para...

O leitor Caio Alves Baron e a leitora Ingrid. A escolha foi realmente difícil, pois todos os comentários foram pertinentes. Eu não adularia esse povo se não fosse verdade, moçada. Realmente mandaram bem. Mas como limitamos a premiação, eles foram os escolhidos desta vez.
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Faça como eles. Leia os textos, deixe seu comentário, e fique de olho nas próximas promoções culturais do Rango Rock.
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Punx Not Profits, sábado 19/06/2010.
Capim Pub, Setor Aeroporto, Goiânia.

16 de junho de 2010

Amadurecer a arte em tempos de "eterna novidade": é possível?

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Os atuais trabalhos musicais que pipocam na internet todos os dias aproveitam de uma nova e excelente vantagem: o absurdo desenvolvimento das ferramentas de mídia. Grava-se em casa, se assim o quiser. Basta ter um PC sem-vergonha igual a esse meu, uma mesa de 4 canais igualmente sem-vergonha, que eu ainda vou ter um dia, e pronto. Estúdio caseiro. Trilhão e meio de vezes melhor que os estúdios de 10 anos atrás. Fico pensando nisso tudo, viu... estou velho? Não. É a velocidade da inovação, não só tecnológica, mas universal, típica da atual fase do capitalismo, que me faz sentir assim, velho aos 31. Considerando-se a expectativa de vida do brasileiro médio, tô é novo ainda. E como a coisa ficou acessível, por que não produzir a própria música, ao invés de somente ser expectador? Essa é a tônica atual. Sim, isso dá uma tese de doutorado, e eu não tô afim de ficar vomitando Adorno aqui não.

Demorou um pouco para eu escrever sobre uma banda que eu gosto muito, e que é uma puta revelação desta nova safra do rock goianiense. A superinformação e a nova forma como abordamos a arte, especificamente a música, neste contexto todo, me deixou atordoado. Eu ouvi tantos My Spaces por estes dias, que tenho a impressão de que toda a música do mundo é produzida em Goiânia. Uma enxurrada de peças de arte, um oceano de opções, onde nossa percepção a conta-gotas custa a apreender algo com significância. É raro realmente “pararmos” para ouvir. Vejo uma cena muito mais interessada em produzir sempre do que absorver a arte já no circuito. Há a necessidade eterna da novidade. E eu já estou quase quebrando meu pacto de não “intelectualizar” isso tudo, pelo menos não hoje.

A Jackie’s Knife é atualmente minha banda favorita de farofagem. Há momentos em que somente um Poison salva o dia, he he he. Há situações que pedem um Skid Row (não me comprometa perguntando que situações são essas, ok?). E depois que eu ouvi o EP auto-intitulado, tratei de gravá-lo em mídia física para ouvir com mais carinho. Não sai do meu Philips velho de guerra há dias.

Ultimamente, só tenho tempo de cozinhar a noite. Há algum tempo, queria fazer um prato que já executara em outras oportunidades, e que meu paladar pedia novamente: Porco à espanhola. Foi nesse dia perdido entre a semana passada e a retrasada, que fundimos, minha esposa e eu, hard rock e uma bela carne.

Fuja de fontes inseguras de carne de porco. É perigosíssima se não veio de um bom criadouro. Já ouviu falar de tênia? Então. Gordura em excesso significa hormônio em demasia, e não propriamente que tínhamos um capadão das costas rachadas. Fique esperto com isso. Cheire a carne antes de comprá-la. Aquele fedorzinho de urina não sai mais, se estiver impregnado na carne. Significa animal mal abatido. Ou falha na limpeza das peças de carne. Ela deve estar limpa, magra e com cheiro só de sangue e sucos próprios dela.

Escolhi uma bela peça de lombo, separada pelo açougueiro-amigo, do mercado ao lado de casa. Cortada respeitando a direção das fibras, em cubos pequenos. Lombo é uma carne seca, se os pedaços a serem preparados ficarem grandes você terá problemas depois para comê-los.

No som, reserve 50 minutos para ouvir, e eu disse OUVIR, o Jackie’s Knife. Tempo suficiente para sacar duas vezes a demo. Acredite, se você gosta de hard rock mela-cueca, vai querer o repeteco. Desculpe-me a rotulagem, mais eu não resisti, he, he, he... No arquivo que baixei da comunidade da banda no orkut, o primeiro som é Eyes on the Highway. Bom som para a abertura. Um baixo simples, simples demais, mas que faz seu papel, acompanha bons riffs, criativos e eficientes. Percebi uma mixagem meio embolada: não sou a pessoa mais indicada para estes pormenores, e na maioria das vezes nem os cito. Bateria tímida, porém bem competente. O vocalista destes moleques me impressiona, pelo seu potencial, em minha modestíssima opinião. Vez ou outra, como em Wild Devil, falta aquele “quê”, parece que a voz não chegou onde deveria, mas essa não é a tônica do trabalho. Na verdade, na maioria dele há agudos afinados, variações de tom bem feitas. Fico imaginando este menino na mão de um produtor profissional.

Hurricane começa com uma senhora introdução, bem hard mesmo. O trabalho dos guitarristas é excelente neste som, o baixo faz um bom fundo. A mim não agrada a “forçação” de vocal, ao estilo cantor de blues americano negro, mas os agudos de voz dados me fazem esquecer isso rapidamente. É som pra chapar, ali na fronteira do rock n’ roll, blues e hard rock.

Já disse aqui neste blog e vou repetir, enquanto o J.K. canta no meu player: carne de porco só se prepara depois que descansa em uma água com limão e/ou vinagre. Lave a carne nesta água, e puf!, desapareceu o problema do “cheiro forte” típico desta iguaria. Em uma panela boa para fritar carne, com bordas, aqueça uma quantidade generosa de azeite de qualidade. Não vale óleo composto, largue a mão de ser pão-duro onde não há necessidade. Cebola e alho já preparados e na espreita, óleo quente, pimba!, doure-os. Frite a carne da forma comum, do jeito que a vovó ensinou pra mamãe. Jamais adicione água. A carne soltará seus sucos, e isso basta. Se quiser, adicione pimenta verde de cheiro na água com limão ali de cima, pimenta esta que vai junto à carne pra panela. Tampe e dê andamento.

Enquanto isso, acompanhado daquele vinhozinho chileno vagabundo (que é vendido por aqui como se fosse a última garrafa de um lote raríssimo), ouça os meninos do Jackie’s Knife tocarem I’ll never cry. Você entenderá o por quê do vinho, ao ouvir essa balada: referências mil aos campeões do estilo – Guns n’ Roses, Bom Jovi e Skid Row. Clichê? Pode até ser. Mas quer saber? É bom demais. Ah, em tempo: se você tem mais po$$ibilidade$ que eu, recomendaria fugir do chileninho vagabundo. Numa estrutura sacada, a banda destila uma verdadeira campeã das dez mais do Cantinho do Coração, aqui na FM da Madrugada. Backing vocals muito bons, bem postados e afinados. Só não entendi uma guitarra arrastando-se no fundo dos dedilhados, nas partes suaves da música.

E aí a carne já está bem cheirosa e dourando. Hora de enfeitá-la. Manjericão nela. Comedidamente, pois esta é uma erva forte, e se passar, estraga a tudo que tocar. Pimentões vermelhos e amarelos, cortados em cubos médios, irão apenas amolecer, e não desmanchar na panela. E se lhe aprouver, cebola cortada em fatias grossas, para perderem o sumo enquanto o prato se acerta. Simples assim. Não permitir que se crie “cascão” no fundo da panela é fundamental para uma boa apresentação da carne.

E do meu toca CD veio uma trilha sonora das velhas propagandas de Hollywood: Rock star. Introdução caprichada, estilão heavy metal. O refrão não é lá muito original, mas o corpo do som é foda.

Minha esposa perguntou se era Bom Jovi ao ouvir Sweet Girl. Poderia citar outras referências menos óbvias, mas foi exatamente esta a pergunta feita por ela. Melodia simples, mas gostosa de ouvir. Refrão bom demais. Faltou mais vida ao violão, penso eu. Um efeito acústico, sei lá. A caída pesada é boa. Bons arranjos de cordas. Wild Devil, com seus riffs matadores, jeitão de lado B de disco bom, foi minha preferida na primeira audição. Como sou muito volúvel, pode ser que isso mude. Mas o som é poderoso.

Não custa lembrar: não sou crítico musical. Não tenho a menor formação para isso, a não ser essa paixão imensa por rock. O que noto no trabalho destes meninos, insolentemente, são arestas a serem aparadas, que um produtor profissional arruma fácil, fácil. Tipo finais abruptos de solos ou frases de vocal. Mas não é nada que desestimule novas e freqüentes audições deste petardo. Eu gostei muito e aguardo ansioso um CD cheio destes caras.

O Porco à espanhola foi bem com o EP do J.K.. E ainda com arroz branco e legumes cozidos em água e azeite virgem. Eu tinha umas poucas alcaparras aqui, e pus nestes legumes – e não é que colou? E fica a lição: nem todo chileninho tinto Carmenère de prateleira em hipermercado vale as dezenas de reais ali depositadas. Hoje eu sei.

Uma arma contra a avalanche de informação musical disponível hoje? Paciência, muita paciência para ouvir. Parece piada no mundo atual, mas sem isso, corremos o risco de nos alimentar de “chileninhos vagabundos” e não conhecer bons trabalhos. O que é bom leva tempo para amadurecer. Eu ouvia gravações da Jackie’s Knife interpretando Guns n’ Roses, há alguns aninhos atrás, e pensava: táquepariu, se esses moleques voltassem esse talento musical para a própria arte, viraria algo muito bom. Dito e feito. Trabalho mais maduro, autoral e de qualidade. Sem modéstia, igual à minha carne de porco, he, he, he...
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Listen to the song!

13 de junho de 2010

Quanto vale o Dia dos Namorados?

Foi interessante ver o shopping na tarde deste último sábado. Trabalho em um colégio que funciona no subsolo de um desses templos do “ter é ser”, a atual religião que arrebanha mais e mais fiéis na elástica classe média brasileira. Centenas e centenas à procura do mimo para a alma gêmea. Estacionamento lotado, cheguei 5 minutos atrasado à sala de aula porque não consegui uma vaga próxima. Dia dos namorados. É isso.

No clima de romance e pra não deixar a chama fraquejar, depois de 2 anos e meio de matrimônio, convidei meu broto para um programa que prometia aquecer os corações vacilantes nesta data tão especial: Baile dos Solteiros, Capim Pub. Animando o ambiente, segundo o e-flyer, Ultravespa, Black Queen, Johnny Suxxx & The Fucking Boys e a banda que embala sonhos de tórridas paixões: Os Canalhas, mais canalhas do que nunca com seu acústico bem-te-vi. Digo segundo o e-flyer porque devido ao horário de trabalho de minha esposa, só chegamos às oito e pouco, após o início das apresentações. Não sei ao certo quem tocava quando entramos: Ultravespa ou Black Queen. Sei que era bom demais, a ponto de eu me dirigir ao baixista deles e mencionar minha felicidade ao ouvi-los, coisa que pela minha timidez patológica, eu raramente faço. O moleque é deveras competente.

Pelo erro de chegar mais tarde, confiando no fuso-horário Goiânia Rock City, sempre 4 horas atrás do horário oficial de Brasília, nos demos mal. Melhor, pagamos caro. Literalmente. Uma pequena fortuna, considerando-se o espaço: 10 paus por cabeça. O velho Capim Pub mudou muito pouco desde que abriu para a música alternativa. A estrutura continua adequada apenas para algumas propostas de eventos. E no nosso humilde entender, não suporta coisas minimamente sofisticadas. Em suma, é tosco. É bom estar lá, mas não é legal ter que segurar a porta do banheiro para usá-lo. Não é legal beber cerveja morna a extorsivos 3 mangos, com a lata fedida. Não é legal não haver conforto para sentar e beber. Mas ainda assim, conta com minha presença em intervalos regulares de tempo. Por que? De certa maneira, essas faltas têm seu charme. E desta vez, havia marcas além da detestável, insuportável e degradante Nova Schin. Bebi 3 Antarcticas. Repito, mornas.

Um excelente público para os shows. Pensando que ainda chegariam mais pessoas para a festa após as bandas, arrisco-me a dizer que o evento foi um suce$$o. Tinha muito tempo que eu não via Johnny Suxxx. Gostei de novo. Não havia as plumas e paetês como da última vez em que os vi, dando aquele toque de escracho próprio deles, mas os senti empolgados tocando. E sabemos que isso vaza ao público. Acaba contagiando. Na segunda música eu já estava batendo o pé, marcando o ritmo. Eu precisava ouvir algo diferente neste dia. De tempos em tempos, saturo-me de hardcore e punk.

Escrevi o segundo parágrafo deste texto completamente influenciado pela proposta desconfortante d’Os Canalhas. Interessante, eu me lembrei do Fat Mike e seu palhaço alter ego ao estar presente em mais uma apresentação da mais pura canalhice pequizeira. A banda estava desfalcada. Ainda não os vi com as backing vocals. E o front man, Wander Segundo, continua com sua voz aveludada.

A proposta da banda é interessante, é inteligente, é instigante. O problema é ter estômago para agüentar Segundo, o “vocalista” da banda, cantando. E de terno. O problema é ter de castigar os tímpanos com o violão desafinado da banda, tampado por uma guitarra que tocava de tudo, menos a música em execução. Não saquei mesmo se era intencional, ou se o guitarrista se perdia. Fato é que eram dois universos paralelos. Repertório digno do “Cantinho do Coração”, programa das madrugas nas FM’s, com aqueles locutores que mandam recados sussurrados do tipo: “- alô, Graziellen! Me liga, to te esperando! Beijo, do seu Wescleynalton”. Ou aqueles programas em que o som rola e o locutor, com voz de disk-sexo, traduz simultaneamente a letra melosa. Infelizmente, o tempo estourou e tivemos que ir embora antes do fim da apresentação. Infelizmente? Bem...

Sei que ao cruzar o portão de saída, meu coração apertou ao lembrar do valor pago para ali entrar. Ou seja, custo-benefício prejudicado na minha conta. Dez paus já valeram mais na cena goianiense. É certo que houve a festa posterior (procede, não é mesmo?), e não a aproveitei. Mas assim mesmo, continua caro. Não pretendo pagar esta dezena de merrecas tão cedo pra ir ao Capim Pub. O meu senso moral me diz que mais de 5 dinheiros é ultrajante, em se tratando do que é oferecido ali. As bandas que estiveram no palco, cada uma com sua proposta, são excelentes e o valem. Não havia nenhuma “verde” na escalação. O meu chororô se refere à casa, e não ao espetáculo.

Dali, seguimos para nosso bar de estimação. Todo mundo que gosta de bar, tem algum que guarda no lado esquerdo do peito. Eu já fui ao antigo Bar da 3, e detestei a experiência. Me lembro de poucos lugares tão ruins. E há pessoas que idolatravam o lugar. Acontece. Já saí de casa para pagar 5 reais em uma cerveja, e recebi um copo americano sujo para consumi-la, depois de apodrecer uma hora na fila. As pessoas que estavam comigo não se importaram, e tiraram muitas fotos para seus álbuns de orkut. Afinal, estiveram ali, naquele bar da moda. Quer porcaria maior que aquele antigo Praia? Então.

Gosto de ser conhecido e chamado pelo nome no bar onde bebo. Gosto de receber tudo muito limpo e decente. De pagar um preço justo por aquilo que como e bebo. De ter conforto, mesmo sendo nas cadeiras de plástico da Skol. E principalmente, de ter o mesmo serviço, se não melhor, que os bares badalados do Bueno e Marista, em frente ao meu prédio. Esse ponto encerra com chave de ouro meu score.

Uma bela e bem servida panelinha de lingüiça caseira, muito bem executada. Simples, despretensiosa, com gosto de comida de mãe. Arroz, lingüiça, tempero à pampa e só. E Antarctica por modestos R$ 3,20. Gelada ao ponto. A noite só começou. O disco de estréia do The Kooks (Inside In Inside Out, de 2006) nos aguardava na vitrola, após o jantar. Um espumante nacional vagabundo já estava na geladeira desde o fim da tarde. O resto é história.

12 de junho de 2010

O purista

(Texto válido para a promoção do evento "Punk is not profits". Comente sobre, e concorra a ingressos para o evento.)
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Minha família é de origem mineira, embora eu seja paulistano. E como mineiros legítimos, há um verdadeiro culto idólatra ao café, hábito que herdei com fervor. O pão de queijo não veio neste pacote de tradições, curiosamente.
Aprendi a apreciar o café nas rodas de causos dos adultos, das quais era difícil participar, pois sempre era expulso dali. “Assunto de gente grande, moleque!”, era sempre assim que terminava um palpite meu. Meus avós maternos são mestres na arte de trazer o passado de volta, com mais sabor na narrativa.
O café não pode jamais ser este “de pacote”. De preferência deve ser comprado em grão cru. Assim, você percebe se há misturas indesejáveis, como soja ou milho velho. Sim, acontece nas melhores marcas e é inclusive permitido pelo Ministério da Agricultura. Estes eram os primeiros mandamentos do velho Dário, doutor honoris causa no assunto, meu falecido avô.
Você não encontra grãos tipo exportação nas feiras livres. Mas isso realmente não é determinante se você não é dono de uma cafeteria sofisticada. Os grãos vendidos nos mercados populares são, em sua maioria, sobras dos cafezais.
O passo seguinte é torrá-lo no ponto adequado. Ter um fogão à lenha ajuda. Nas casas de produtos agropecuários, você acha com facilidade o torrador de café, que se assemelha muito com uma pipoqueira antiga. O chamado “ponto forte” é alcançado somente por mestres. É a fronteira entre queimar o grão e apenas torrá-lo. A ciência do sabor do café passa por aqui. Teremos café com gosto de carvão se houver imperícia. Nunca vi o velho Dário errar um ponto sequer.
O passo seguinte é moer o grão torrado. No moedor manual, é claro. Também encontrado nas melhores casas de produtos do campo. Saber regulá-lo também é mister. Um pó fino em demasia prejudica a infusão por ser mais difícil de “passar” no coador, além de ser mais difícil de se obter no moedor. Um pó excessivamente grosso não retém a água o suficiente.
A infusão não pode nem sequer ser imaginada se não em um bom coador de pano. É ritualístico. Colocar o pó para esquentar junto com a água é simplesmente sacrilégio. Ele deve ser colocado à parte dentro do coador para esperar a água. E sim, está certo ali atrás: esquentar. Água fervente, borbulhando, queima o pó. Ela deve ser despejada nos primeiros sinais de fervura. Dica: quando as bolhinhas surgirem na parede da caçarola, segundos antes da fervura total. Você não tem uma caçarola? Oras, em que mundo você vive, afinal?
O bule de metal recebe o café direto do coador. Nada de transferir de recipiente, pois não queremos beber suco de café. Ah, sim... se você tem uma garrafa própria para o café e fere a mística de consumi-lo direto do bule, evite passá-lo por um bule, e coe-o direto na garrafa.
O açúcar é opcional. No rito Lopes, ele quase não está presente. De tão pouco, ele vai direto diluído na água. Mas isso é aí, com o seu paladar. Tente experimentar o café e seu amargor sem a presença ostensiva do açúcar. Converse com o gosto do grão. Sinta o imenso prazer da absorção de cafeína sem intermediários. Essa é outra dica.
Café frio é conteúdo de cano da pia. Perde todas as propriedades gustativas depois que esfria. Oferecer-me café esquentado é uma ótima maneira de produzir uma péssima imagem de quem tem essa coragem. Que tipo de sujeito bebe café esquentado? E pior, que tipo de ser humano oferece isso aos convivas?
A degustação deve ser feita prazerosamente. A arte de conversar com o paladar e apreender o sabor do café vai contra todo e qualquer ditame do fast-food. É um verso de amor e militância à slow food. Ouvir os causos dos avós, no quintal de terra, debaixo da mangueira, bebendo café e aguardando as roscas da vovó ficarem prontas. Eu chamo isso de felicidade. E eu tive isso.
Sigo cada passo dos ensinamentos do velho Dário. Ele gostava de degustar o café no nascer do sol, todas as manhãs. Ouvindo uma rádio AM, onde cantavam Tião Carreiro e Pardinho, Pedro Bento e Zé da Estrada, Tonico e Tinoco. Eu sentava ali na cozinha com ele, esperando o chamado para o resto da família, avisando que o café estava pronto: “Ó o Móca!”. Aquilo me dava uma alegria imensa. Hoje, me dá uma saudade lancinante.
O gosto do café combina com tudo, é verdade. Embala minhas incursões pretensamente literárias, minhas horas de folga na internet, as audições de certos tipos de música. Na minha cabeça, combina demais com jazz, britrock e moda de viola raiz. Tem gente que jura que combina com rock pesado. Eu não consigo ouvir Disrupt ou Iron Maiden bebendo café. Até consigo, é verdade, mas não faz o menor sentido.
É certo que continuarei sendo o bastião da arte do bom café. Os milenares códices a mim foram confiados, não posso falhar. Avante, nós!, os viciados em cafeína!

19 de março de 2010

PRIMEIRO FELIZARDO!!!

O leitor Bruno Abnner foi agraciado com um ingresso na faixa pro evento Capim Caos. E tudo o que ele fez foi comentar de maneira muito pertinente, diga-se, o texto abaixo.
Então, daqui pra frente, seja esperto como ele: esqueça a porra do orkut e interaja aqui conosco.
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Parabéns, Bruno. O blog ficou lisonjeado com os elogios e considera seu comentário sobre a temática do texto proposto muito equilibrado e perspicaz. Bom show!

15 de março de 2010

Desligando-se.

(Texto para a promoção cultural do evento Capim Caos. Comente sobre ele, os dois melhores comentários ganham ingresso para a gig!)
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Há trinta e sete minutos atrás começou mais uma segunda-feira. O Ignite canta baixinho nas minhas caixas pífias, “Embrance”. Faltam 5 horas pra recomeçar todo um ciclo, onde eu me religo com um mundo que está me desumanizando. Café, trânsito, trabalho, trânsito, almoço de plástico, trabalho, trânsito, casa. Qualquer fuga a isso, e sou punido pelo tempo policiado, pois atrasos em prazos aparecem. Rotina. Desencanto.
Eu sou idealista quanto à minha profissão. Não caí de pára-quedas nisso tudo. A sala de aula me realizava. Hoje, sou empregado de todo um sistema de fazer grana, ligado à indústria do vestibular. Lamentável, triste.
Seguir em frente porque há a coersão do mercado e da própria sobrevivência. Me vejo castrado e impotente frente a isso. E estou profundamente cansado, física e mentalmente. Sou mais um do “clube”, que infelizmente toma consciência do seu papel degradante nessa porra toda. Gostaria, agora, de não ter senso crítico e me esbaldar tranqüilo em todo o crédito que me é oferecido, para que eu me enterre pra sempre nesse esquema. Eu compraria a felicidade, que seria entregue em casa, financiada em até 60 meses sem entrada. Uma dúzia de malditos que li uns anos atrás nos bancos acadêmicos não me deixam ser feliz e mergulhar nessa.
Eu costumava me livrar de tudo isso, pelo menos momentaneamente, me envolvendo minimamente com hardcore. Eu sonhava com o mundo melhor ao alcance das minhas mãos. Ouvindo discos, traduzindo letras, tocando em bandas, indo aos eventos, lendo e escrevendo fanzines. Enfim, o de sempre pra todo mundo que gosta de hardcore e punk.
Eu costumava sonhar hardcore, hoje não mais. Eu ainda vejo meus amigos por aí e me divirto. E isso me faz bem. Eu ainda ouço muitos discos, bons como esse do Ignite que me faz embargar a voz, mas minha fé está se esgotando. Eu ainda vejo muitos fanzines na internet e fora dela (em Goiânia, quase nada), mas me cansei dos mesmos erros de português, e da mesma falta de objetividade de sempre na esmagadora maioria deles.
Eu tinha uma ilusão, que só se desfez tardiamente. Eu imaginava que era possível, neste mundo em que nós vivemos, abandonar uma perspectiva individualista e construir uma via alternativa coletiva pro hardcore goianiense. Pessoas somando com outras, e deixando o ego guardado em casa.
Eu me iludia a ponto de vislumbrar mesmo um esquema que se auto-sustentasse, pra produzir arte contracultural, à margem da pespectiva conservadora e embalsamada do rock. Eu jurava que podia fazer parte de um momento único (porque eu estava lá) em que o hardcore seria verdadeiramente contra-hegemônico, e que idéias circulariam em diversas formas de mídias. Seria o meu Rosebud, guardada a empáfia da comparação.
E toda vez que me reaproximo da cena hardcore, vejo que estou mais enganado. Salvo as exceções que sempre existem, a mesma coisa de outros dias: só música, só entretenimento, só diversão. Não é que eu não goste de me divertir. Mas eu gostaria de acrescentar algo à minha formação como ser humano também. Curtir som é massa, saber por que ele foi escrito, é melhor ainda.
Ideologicamente, a gente vai se desligando. Mantém o que herdou da coisa toda. Mas, como organicamente o hardcore chegou ao seu limite na vida de um cara com 30 anos, o que resta é pensar outras formas de tentar romper a gaiola na qual estou preso. Ao assistir a uma manifestação artística de hardcore hoje, não sinto mais meu mundo mudando. Sinto meu mundo se amenizando, me dando um tempo.
Não consigo relativizar tanto o conceito de hardcore a ponto de dizer que vale tudo dentro da música. O punk hardcore nasceu com identidade. Parte dele foi realmente cooptada, pois não há donos da arte, ela faz parte do espírito humano, já dizia o filósofo. Mas a essência ainda poderia ser trabalhada: resistência. Ao reproduzirmos o discurso da arte pela arte, este cara aqui desanima.
Mesmice no trabalho, punhetagem de conteúdo pra passar no vestibular. Mesmice no hardcore, punhetagem na produção artística e discurso vazio, como cabeça de adolescente pós-moderno.
Quem nunca ouviu/entendeu o Ignite, taí uma sugestão.

9 de fevereiro de 2010

Sábado de fast-food no Martin Cererê: Covernation 2010.

Eu era sempre um dos primeiros a bradar contra eventos de covers. Eu era intransigentemente contra ocupar espaços culturais com embustes e micagens dos ídolos do mainstream, já que é tão difícil conseguir tais espaços.
Eu era.
Sábado 6 último eu mudei minha opinião parcialmente: estive no Covernation. Saquei que aquilo é muita diversão em um lugar só. O evento mobiliza a cidade, ou pelo menos parte dela. A gurizada vai à estratosfera da felicidade. O Martin Cererê lota. É sem dúvida um dos grandes eventos de rock do calendário goianiense.
Eu explico minha implicância com bandas/eventos covers: nada é produzido, tudo é copiado. É a reprodução de algo às vezes já pasteurizado pela grande mídia de rock. É enfadonho porque não há surpresas, sabe-se exatamente o que vai acontecer.
A salva-guarda do festival em questão foi exigir das bandas inscritas trabalho autoral. Achei isso bacana da parte do idealizador, Richard Ferreira. Assim, evitou-se a principal crítica que este tipo de festival suscita: tirar a vez de quem rala tentando criar seu próprio trabalho.
Por outro lado, o estigma de cidade que gosta mais de covers do que de suas próprias “crias” continua: o Covernation leva mais público do que 80% dos festivais ao Martin Cererê. Dentre n outros fatores, justamente porque a rapaziada público-alvo sabe que só vai ouvir seus heróis de MTV. Ou outros clássicos não tão conhecidos do grande público televisivo, mais ultra-sacados no mundo dito alternativo. Em suma, ainda é um festival de covers, imitações, algumas bem baratas, e isso não se pode apagar.
Volto a dizer: me diverti pacas. Poguei, gritei, subi ao palco e cantei um som inteiro do Cólera, na fodástica apresentação do Sangue Seco, topei vários camaradas das antigas e das novas, poderia ter juntado uma turma toda de alunos lá dentro (uns 20 no mínimo), enfim. Ainda assim, não saía da minha cabeça a pergunta que não consigo responder: por que o público goianiense tem esse fascínio tão grande por projetos covers? Talvez eu finja não saber a resposta, pois assim fica mais cômodo raciocinar. Talvez. Um dia a gente volta aqui, certamente.
Chegamos por volta das 4. Pelas histórias a mim relatadas, eu esperava encontrar uma fila e quem sabe até não conseguir encontrar ingressos promocionais a 5 reais. Ledo engano: tudo tranqüilo e sossegado, ingressos na mão e um estranhamento inicial – Martin vazio. No folclore do Covernation constava pontualidade, e isso não demorou muito para ficar só no mito mesmo. Atrasos em eventos de rock são parte de um culto poderoso, indestrutível. Fiquei feliz pelo pouco atraso, e isso já é um começo.
Aos poucos, o lugar foi enchendo das mais variadas espécimes da fauna roqueira. Fico realmente impressionado como essa rapaziada de agora tem disposição para “tunar” a aparência: tatuagens, piercings, cabelos coloridos por mais cores do que eu imaginava existir. Um festival de excentricidades. A molecada ainda quer chocar, é fato.
Sábado de sol goiano, sempre acima dos 30°C. Adrielle e eu merecíamos uma cerveja gelada. Li em algum lugar que o bar seria terceirizado. Algo sobre a Fósforo assumir. É comum eventos patrocinados oferecerem somente uma marca de cerveja, mesmo sendo uma de muitas de uma mesma multinacional. Sinceramente, não sei se foi o caso do Covernation. Fato é que só havia uma marca disponível: Skol. Sabemos da facilidade que isso pode oferecer para trabalhar com caixa, ao padronizar valores. Porém, no quesito agrado ao público, isso pode ser um desastre. Ao comprar cerveja ouvia um ou outro reclamar sua marca favorita, não presente no bar. O vício do povo brasileiro por filas é algo hilário: em frente ao caixa perfilavam-se 20 pessoas, enquanto no guichê de entrada do Martin comprei minhas fichas de água e cerveja sem ninguém a minha frente.
Minha primeira lata acredito ter saído diretamente do pacote, passado por um espanador de poeira e servida a mim. Quente. Nem fria. E choca. Não acredita? Pois eu vou repetir pra quem mais quiser ler isso aqui: choca. Entendo que contensão de gastos é importante. Entendo que sobrar cerveja em um evento já ocorrido acontece. Mas daí a ser servida pra mim, e qualquer outro consumidor desavisado, peralá. Chega a ser insultante o staff do bar imaginar que um consumidor regular de cerveja não reconheça um produto deteriorado.
Começo com pé esquerdo. Mas cara, era sábado. E nesse eu ainda não trabalhava. Precisava de muita coisa pra derrubar meu humor. E ao entrar pra ver o Ultravespa mandar um Cascavelletes, banda que realmente eu não me interesso, tudo voltou a ser ensolarado. Puta show legal de se ver. Gosto muito quando se vê a alegria no rosto do músico no palco. Levei o show como se os sons fossem deles. Facilitou eu não me lembrar de muita coisa da banda homenageada. Ainda bem.
A segunda cerveja deve ter ficado uns 10 minutos no freezer. Estava fria. No terceiro gole já havia se igualado à primeira. E isso por extorsivos 3 reais. Um verdadeiro absurdo, incompreensível. Não tive coragem de bancar o consumidor consciente frente à simpatia dos atendentes. A terceira lata eu pedi que fosse trocada. Duas vezes. E não adiantou. Continuei recebendo latas de cerveja frias, nada convidativas. Junta-se a isso o fato isolado de eu não ter a Skol na lista das mais. Sim, essa parte de bar fudeu mesmo.
Fui seletivo quanto aos shows. Só experimentei algo diferente vendo o Ultravespa. Estava ansioso para ver os Engravatados mandando sons da única banda que me empolga na geração 80 do rock brasileiro: Ultraje a Rigor. E acredite: foi um puta espetáculo! A banda é deveras competente, executou as músicas com maestria. Coisa bonita de se ver. A energia contagiou o público, que começou a se soltar no pit. Todos os clássicos, músicas cantadas em coro com a moçada.
Minha fome teve vergonha de prosseguir a aporrinhação quando ela soube do preço do cachorro-quente: 3 reais e 50 centavos. A única iguaria comestível no ambiente. Me parecia um bom bate-entope: muito condimento, recheio generoso. Tamanho diminuto, porém, para a pequena fortuna cobrada por ele. Quem é assíduo freqüentador de pit-dogs sabe do que estou falando.
Precisava sair do Martin para esperar amigos que haviam combinado de aparecer no evento. Ponto de referência: Praça Cívica, posto. Esperando e me deliciando com Heineken gelada por modestos R$2,70. Isso sim. Deixa eu destacar de novo uma parte importante: gelada. E Heineken. Numa loja de conveniência, que ganha horrores no preço final da cerva. Aproveitei a deixa: tomamos 4 verdinhas.
Quando de volta ao Martin, eu ouvi o Sangue Seco conclamando as hordas hardcoreanas com golpes brutais nos tons da batera, dando início à “Medo”, hino do Cólera. Eu disse a mim mesmo: meu sábado de diversão começou. O repertório perfeito, a energia pulsando do palco (mesmo com o Eduardo Inimigo, vocalista, insistindo no discurso “somos velhos e blá, blá, blá”), a interpretação seca e violenta, virulenta da banda – eu fotografava, eu cantava, eu pogava. Eu não, nós. O teatro inteiro. No pit, a ritualística roda se abre: a molecada dava mostras do que o rock é capaz, onde ele vai além das demais estéticas musicais.
Fim do show, camisa bege do Cólera empapuçada de suor, a Kodakizinha com pilhas fracas e fotos beirando o ridículo. Não adiantava regular o flash. Não havia mais força nas pilhas para tanto. Outra Skol pra ratear o calor? Não, obrigado. Meu bolso, meu paladar e minha vergonha na cara agradecem.
Eu vejo os Ramones como um rito de iniciação: a coisa toda tem de começar ali. One, two, three, four é básico. Deveria ser matéria escolar. Os Bizarrones fizeram jus a esta minha posição. Dizer que se ateram aos clássicos seria ingenuidade: há como fazer um show só de clássicos de mais de 2 horas. Você, eu e as pedras de Pirenópolis sabemos disso. Uma verdadeira avalanche de hits. Muitas fases da banda sendo abordadas. Show incrível. Cantei muito. Não nos microfones, super disputados pelo público. Moshs insanos, pois a segurança passou a aliviar a barra. Festa bonita de se ver.
Tirei um dia pro fast-food. O Covernation é um espetáculo que, para o público comum, como eu, é bem organizado, em comparação com outras experiências por aí. Mas é fast-food. Enlatado. É a celebração do trabalho alheio, no caso da música que eu ouvi por lá. É hiper-divertido, agrega público que dificilmente cola em outros eventos, movimenta a cena. Mas tem contra si a atitude de incentivar o trabalho não autoral, mesmo com a exigência de que só participassem bandas autorais. O público presente reafirma seu gosto pela produção artística não-autônoma. Isso é “cultural” por aqui.
Fast-food: é uma delícia na hora. Deixe 10 minutos ao relento e você terá comida cancerígena, dizem uns. Muito boa pedida de vez em quando. Você come, satisfaz a necessidade de gordura saturada e açúcar e por dias, seu cérebro fica feliz. Com música também é assim. Cover de vez em quando é muito legal, vi isso de perto. Mas se rola sempre, enjoa. Dá câncer na cena local. É prato de consumo rápido e esporádico. Se eu pudesse recomendar algo, eu diria que um evento desse tipo por ano é a pedida. A julgar pelo público que ele arrastou para o Martin neste sábado, penso que alguns produtores não estão interessados em deixar esse filão pra lá. Richard terá concorrentes em breve, eu sei.
Após o show dos Bizarrones, Dri e eu nos demovemos. Precisávamos comer algo, e em nenhum momento nos sentimos atraídos pelo cachorro-quente, a ponto de ir contra nossos instintos e desembolsar R$3,50. Há um bom bar em frente ao nosso prédio, que serve uma senhora porção de filé de frango grelhado por 15 lascas. E Brahma 600 ml noiva por 3.
Tenha certeza: no próximo Covernation eu estarei lá. Não sei se com o blog, mas estarei. De vez em quando, comer fast-food é bom para a alegria.
Veja aqui algumas fotos legais, outras nem tanto:
Não tive tempo hábil de editá-las. Prato cheio, hein? Divirta-se!